RITO SÃO JOÃO - Da Hungria para o Brasil

 


O trabalho dos Irmãos Eugene Laxa e Will Read, publicado em 1978, no Volume 90 da Ars Quatuor Coronatorum, sob o título “THE DRASKOVIC OBSERVANCE – Eighteenth Century Freemasonry in Croatia”, nos apresenta um rico e esclarecedor panorama sobre as circunstâncias que levaram à criação do Rito São João na Hungria. Nele os autores ilustram a sua ancestralidade fundamentada na Observância criada pelo Conde, Militar e Maçom Ivan Draskovic.

A própria Grande Loja Simbólica da Hungria afirma, em seu sitio na Internet, que a Observância Draskovic foi a única obediência Maçônica genuinamente Húngara.

No entanto, pelo banimento da Ordem dos Territórios Húngaros por sete décadas e pela perseguição da Maçonaria por regimes totalitários que se sucederam na região, muitos documentos se perderam, foram destruídos ou ainda não foram localizados. Isto dificulta o entendimento de como se deu a transição da Observância Draskovic para o Rito São João.

A Primeira Loja a praticar este Rito no Brasil foi a Loja Resurrectio – nº 99, fundada em 1956, pertencente à Grande Loja Maçônica do Estado de São Paulo (GLESP) e é sobre esta saga de coragem e amor pela prática da Arte Real que tecemos estas considerações. 

 

UMA HISTÓRIA DE RENASCIMENTO

 

O ano de 1956 foi especialmente turbulento para a população Húngara. Eclodia a revolta contra a ditadura do Governo Soviético que ocupava o país desde o final da 2ª Guerra Mundial.

A União Soviética reprimiu esta revolução com mão de ferro, resultando na morte de mais de 2.500 soldados Húngaros, 700 soldados soviéticos e na fuga de centenas de milhares de cidadãos húngaros, abandonando suas histórias e seus bens na busca de sobrevivência em outros recantos do mundo.

Muitos deles vieram para o Brasil onde encontraram uma nação em franco crescimento econômico, industrial e repleta de oportunidades para reconstrução de suas vidas destroçadas pela violência da guerra.

Já no início da década de 1950 cidadãos de origem Húngara (dentre eles vários Maçons) se reuniam em São Paulo, no chamado Círculo Húngaro, para estudos e debates dos temas relevantes da sociedade.

Eis que surge, em um jornal de língua Alemã, o seguinte anúncio:

“Homens livres e de bons costumes querem entrar em contato com outros homens livres e de bons costumes”

Um dos membros do Círculo Húngaro atendeu ao chamado e, destes contatos, nasceu a Loja Humanitas, em 1952, sob a jurisdição do Grande Oriente do Brasil (GOB), porém funcionando sob o Rito Schroder, em língua Alemã.

 

Figura – Recorte de notícia do Jornal O Estado de São Paulo - 04/11/1956

 

Com a chegada dos refugiados, em 1956, e natural aumento da colônia Húngara em São Paulo, surgiu a vontade de se fundar uma Loja de Húngaros, mas o pedido foi negado pelo GOB.

Os Irmãos então procuraram a GLESP, foram acolhidos pelo então Grão Mestre Francisco Rorato e, no dia 06 de dezembro daquele mesmo ano, oito Irmãos fundaram a Loja Ressurectio – nº 99, finalmente trabalhando sob o Rito São João.

Os Rituais chegaram escondidos ao Brasil, pelos Irmãos que haviam sido iniciados na Hungria, em forma de filmes e foram rodados em mimeógrafos. 

Até 1983, só se iniciava nesta Loja quem falasse Húngaro, pois os rituais estavam todos escritos naquele idioma.

Com o natural envelhecimento dos membros da Loja, ficou clara a necessidade de se ampliar o escopo de potenciais iniciados e os rituais foram traduzidos para o Português, facilitando assim a recepção de candidatos brasileiros.

Os Rituais originais estão atualmente expostos no Museu da GLESP.

Por mais de 50 anos esta Loja foi a única a praticar o Rito e apenas em 2009 a segunda Loja foi fundada no Brasil.

Atualmente a GLESP possui cerca de 890 Lojas e destas, apenas 09 lojas simbólicas praticam o Rito São João e também a Loja de Pesquisa Quatuor Coronati São Paulo 333, sendo a única Obediência Maçônica Brasileira a praticar este Rito.



 Figura 2 - Estandarte da Loja Resurrectio - nº 99. Em volta pode-se ver o nome das Lojas de                     Origem dos Irmãos Fundadores.

 

SOBRE O RITO

 

O Rito São João conserva a sua simplicidade e muitas características de suas origens militares e iluministas do século XVIII.

Esta simplicidade e objetividade original do Rito pode ser facilmente constatada pelo exame do trecho final do citado trabalho dos Irmãos Laxa e Read, onde eles resgatam o próprio texto do Ritual praticado pelo Irmão Draskovic.

A decoração de uma Loja de São João é bastante simples e, a exemplo do Rito Schroder, toda a simbologia dos trabalhos encontra-se sintetizada no Tapete Ritualístico, também chamado de Tapis, ladeado por três castiçais altos.

É simples entendermos a função originária deste tapete.

Muitas Lojas fundadas pelo Conde Draskovic funcionavam nas fronteiras pois seus integrantes eram militares que, não raro, estavam em conflito e precisavam se deslocar rapidamente. 

Isto posto, para “desmontar” uma Loja, praticamente era necessário apenas recolher o Tapete e alguns poucos objetos ritualísticos.

Tanto Draskovic como Schroeder eram “dissidentes” da Estrita Observância Templária e formularam seus próprios Rituais e, por isso, costumamos dizer que os Ritos São João e Schroeder são Primos-Irmãos, pois têm uma raiz comum e muitas semelhanças na dinâmica dos trabalhos.

A influência Iluminista também é marcante pois o Rito São João possui uma ritualística mais simples e objetiva, sem influências místicas ou esotéricas e focado no estudo no crescimento intelectual de seus membros.

Esta liturgia mais concisa permite um maior aproveitamento do tempo para discussões sobre Cultura Geral e Maçônica. Salvo raríssimas exceções, em todas as reuniões há apresentação de trabalhos e estudos, seguidos de edificantes debates sobre temas voltados para o aperfeiçoamento do homem e da sociedade.

Isto faz parte do conceito de Formação Permanente do Maçom e da premissa de que o homem só pode evoluir pelo exercício de suas capacidades intelectuais garantindo a dignidade da existência humana na vida terrestre.

Parafraseando Kant: É o homem libertando-se de sua menoridade intelectual e ousando buscar o conhecimento por seus próprios esforços, sem depender de forças metafísicas ou de um determinismo divino.

 

O Irmão Aleksandar Jovanovic cita a socióloga britânica Margaret Jacob, numa de suas obras sobre o Iluminismo:

“Durante o século 18, as Lojas maçônicas conseguiram transformar os ideais filosóficos do Iluminismo em comportamento individual. A busca da perfeição humana para os maçons transformou-se em racionalidade, tolerância, sociabilidade e comportamento ético. ”

 

Segundo o documento Systema Constitutionis Latomiœ Libertatis sub corona Hungariœ, in Provinciam redactœ (Conjunto das Constituições dos Pedreiros Livres, redigido na província, sob a proteção da coroa da Hungria), escrito por Draskovic em 1775 e só recentemente descoberto, nossa Ordem teria originalmente sete graus.

No entanto, quando adotado oficialmente pela Grande loja Simbólica da Hungria, ele já constava apenas com os três graus simbólicos, não reconhecendo os altos graus. Mais uma transição que ainda está por ser explicada.

Esta é outra similaridade com o Rito Schroder, pois, alinhados com o pensamento dos fundadores da Primeira Grande Loja (também chamados de Modernos), defendiam que a profusão de graus posteriores ao de Mestre não integrava a Maçonaria Primitiva e Original prestando-se apenas a conferir nobreza e atrair as classes mais abastadas, fascinadas pela perspectiva de uma ligação com as Ordens de Cavalaria e seus títulos.

Sua simplicidade originária reflete-se também no fato de não possuírem, tradicionalmente, a figura destacada do Mestre Instalado. No entanto, por força de adequação ao Regimento Interno da GLESP, adaptações foram necessárias a fim de que os Veneráveis, ao serem eleitos, pudessem passar pela cerimônia da Instalação.

No Rito Escocês Antigo e Aceito os Mestres Instalados sentam-se no chamado “Oriente”, local da Loja, próximo ao trono do Venerável Mestre e separado do "Ocidente" por uma pequena balaustrada.

Pois bem. Na configuração de uma Loja do Rito São João não existe tal balaustrada e, por consequência, não existe Oriente fisicamente delimitado, o que é mais um argumento favorável à simplicidade e humildade fomentada pela prática deste Rito e a valorização da igualdade fraternal em Loja.

 

CONSIDERAÇÕES FINAIS

 

A História do Rito São João e sua acolhida pelos Brasileiros são demonstrações do poder da perseverança sobre as adversidades. Um testemunho vivo do genuíno Espírito Fraternal Maçônico e a sua vontade férrea de fazer valer a liberdade humana.

Esta singela peça de arquitetura tem o objetivo de render homenagem a todos os Irmãos que, desde a luta pela vida, no teatro beligerante da revolução Húngara até o brilhante renascimento do Rito em solo Paulista, deixaram suas marcas na História como verdadeiros defensores das tradições, da liberdade e das Luzes da Razão em nosso solo pátrio.

Não existe Rito melhor ou pior. Existe o rito mais ou menos harmônico com as convicções e perfis dos Maçons. A Maçonaria é generosa nos múltiplos caminhos que oferece aos que a procuram seja buscando uma prática mais metafísica, seja sob um viés mais racionalista, pois a base, o alicerce é a melhora do homem para melhora da humanidade.

Definitivamente o Rito São João é adequado aos que desejam praticar uma Maçonaria centrada no Potencial Humano de aprimorar sua moral, sua cultura, sua atuação social e de buscarem a Verdade por seus próprios méritos, com o natural respeito à força maior Criadora deste universo, mas libertos de quaisquer dogmas ou afirmações que não sejam sedimentadas na liberdade de pensamento e questionamento, ingredientes fundamentais, principalmente, para a prática do trabalho maçônico sob o aspecto investigativo.

 

 

 

 

Bibliografia Consultada:

DENES , P., & JOVANOVIC, A. (2006). CONSTÂNCIA NO TRABALHO – Edição Comemorativa dos 50 Anos da ARLS Resurrectio – nº 99. SÃO PAULO: GLESP

GOULD. R.F. – HISTÓRIA CONCISA DA MAÇONARIA – VOLUME III. Tradução José Filardo.

GRANDE LOJA SIMBÓLICA DA HUNGRIA. OS PRIMEIROS PASSOS NA HISTÓRIA DA MAÇONARIA MODERNA. https://www.szabadkomuves.hu/a-modern-szabadkomuvesseg-tortenetenek-elso-lepcsoi/  Consulta realizada em 13/09/2020.

LAXA,E., & READ,W. (1978). THE DRASKOVIC OBSERVANCE – Eighteenth Century Freemasonry in Croatia. ARS QUATUOR CORONATORUM – VOLUME 90.

GRANDE LOJA MAÇÔNICA DO ESTADO DE SÃO PAULO (2014). RITO SÃO JOÃO – Ritual do Primeiro Grau (Aprendiz Maçom) e Rituais Especiais. SÃO PAULO: GLESP

Uma Iniciação Mitológica e Filosófica


 

Caríssimos Irmãos

Que maravilhosa Ordem é esta que nos permite acessar as mais diversas áreas do conhecimento?!!! Há caminhos para todos os gostos!!! 

É um desses caminhos sobre o qual gostaria de comentar: A Mitologia e sua prima-irmã, a Filosofia.

Em pesquisa geral e especialmente na Pesquisa Maçônica há uma frase que costumo repetir à exaustão:

"Puxamos uma pena... e vem uma galinha!"

Bom! Sobre a Mitologia trilhei um caminho insólito. Tudo começou com o interesse de minha esposa pelas obras de Madame Blavatsky e a Teosofia. Este termo, Teosofia, me chamou a atenção e descobri que era um termo de origem neoplatônica, ou seja, um conjunto de doutrinas de inspiração platônica.



Sócrates - 469 a 399 a.C.


Pois bem! Chegamos,então, ao conhecido Platão, discípulo de Sócrates, considerado o Pai da Filosofia e que, dele mesmo, nada deixou de escrito. Tudo o que ensinou foi registrado por seu pupilo e admirador que, na verdade, não se chamava Platão e sim Arístocles.
Este apelido ele ganhou por ser um atleta e de forte compleição física. 

Platon significa ombros largos, omoplatas largas, uma marcante característica deste pensador grego.

O grande Sócrates, filho de um pedreiro e de uma parteira, se utilizava de uma técnica através da qual ele conduzia seu interlocutor por caminhos intrigantes da argumentação. Esta técnica chamava-se maiêutica e, através dela, Sócrates, em um tributo ao ofício de sua mãe, fazia "parir" as verdades.

Eis que me ocorre a seguinte questão: Qual teria sido a substância a partir da qual Sócrates desenvolveu seu conhecimento? Quais histórias teria o menino Sócrates ouvido de seus ancestrais? Que fonte cultural teria alimentado aquela mente naturalmente iluminada?

Estas questões me levaram a uma obra maravilhosa chamada "A Cidade Antiga", de um autor com o estranho nome de Fustel de Coulanges. Nesta obra, meus Irmãos e amigos, somos levados a um passeio pelos costumes e religiosidade do povo grego arcaico, aqueles que habitaram e povoaram as ilhas gregas 1000 anos antes de Sócrates e cuja cultura certamente influenciou as histórias fantásticas de Homero e Hesíodo.

E como falar em Homero sem mencionar uma de suas maiores obras, a Odisseia? Sobre esta fantástica obra, tive a felicidade de encontrar uma edição traduzida por um português especialista em Grego. Trata-se da obra "A Odisseia de Homero - Adaptada para Jovens", por Frederico Lourenço, onde temos acesso em uma prosa de grande fluidez e leitura fácil ao invés do texto original em versos e bastante indigesto a nós mortais.





O livro narra as aventuras e desventuras de Odisseu que, após lutar na Guerra de Tróia, tenta voltar ao seu lar em Ítaca, mas encontra inúmeros obstáculos pelo caminho: criaturas míticas, fúria de deuses etc.Uma leitura imperdível.

Por sinal, pouco antes desta postagem, encontrei outra obra do tradutor Frederico Lourenço: trata-se da "Ilíada de Homero - Adaptada para Jovens". Pela qualidade da primeira não hesitei em encomendá-la. A Ilíada narra o penúltimo ano da Guerra de Tróia e seria, cronologicamente falando, anterior à Odisseia.




Deixando um pouco esta viagem em direção ao passado me senti interessado em voltar ao mundo Platônico e, mais uma vez fui brindado com a descoberta de um fantástico canal no Youtube, a Escola de Filosofia, onde o Professor Leonardo Zucarato Ferreira verdadeiramente e brilhantemente disseca obras clássicas do conhecimento humano e a partir daí foi ladeira abaixo. 

As aulas sobre Platão, Nietzsche, Kant e tantos outros que me direcionaram para outra grande obra. Um best seller: Aprender a Viver, do Luc Ferry. Um verdadeiro passeio pela Filosofia em uma linguagem supertranquila. Uma deliciosa leitura.



E qual não foi minha surpresa ao saber que este grande autor havia publicado uma sequência de seu livro dedicada exclusivamente à Mitologia?

A Sabedoria dos Mitos Gregos: Aprender a Viver II me absorveu numa leitura frenética da primeira à última página. Esta obra me deu a certeza de que tanto a Filosofia quanto a Mitologia podem estar presentes em nossas vidas muito mais do que imaginamos.

A vida como ela é, o mundo real está mais do que representado nos símbolos mitológicos. Nossa existência é uma luta heroica contra a Hybris que nada mais é do que o desequilíbrio do cosmos, o aumento da Entropia, a tendência ao caos de todos os sistemas universais. É tudo que vai de encontro à Ordem natural das coisas.

E para reduzirmos a Entropia e restaurarmos a Ordem precisamos dispender energia. Já abordamos este tema no artigo "A Física Maçônica".

Ao viajarmos através de outras Mitologias (Egípcia, Nórdica, Persa, Cristã etc) constatamos que os arquétipos da humanidade tramam um grande tecido que cobre uma Verdade única, mas ela, a Verdade quer se mostrar e aparece aqui e ali, caprichosamente se esquivando às nossas buscas.

Pois bem, meus queridos Irmãos e amigos, eu vos convido a mergulhar neste universo tão mágico quanto real, tão antigo e atual que é a Mitologia e deixo para vossa apreciação dois frutos de minha lavra mas em formato audiovisual. São singelas abordagens sobre a origem dos Deuses sob duas visões diferentes, mas conexas: a Egípcia e a Grega.

Estão bastante longe de representarem um estudo profundo e destinam-se mais a fomentar o interesse dos Irmãos em visitarem o interior de suas almas e, retificando-se, buscarem suas pedras filosofais.

Um Tríplice e Fraternal Abraço













https://youtu.be/FY06rdon_vs
















https://youtu.be/pTol9gzS1TY

























FRATERNIDADE X LEGALIDADE


Uma convivência possível




Um dos solenes compromissos que juramos honrar quando do ingresso nas fileiras desta Augusta e Respeitável Ordem é o de obediência à legislação Maçônica e as Leis do nosso Grande País.

Outro fundamental compromisso é o de auxiliar nossos Irmãos naquilo que for justo.

Dentre tantas obrigações assumidas por um verdadeiro iniciado, estes citados compromissos por vezes parecem se mostrar conflitantes nos corações e mentes de alguns Irmãos.

Na sociedade profana é lugar comum o estereótipo da Maçonaria como uma sociedade de auxílio mútuo irrestrito. Somos muitas vezes tomados por um grupo que acoberta as próprias falhas e procura atenuar as suas conseqüências e isto, além de inaceitável, mostra-se bastante pernicioso para a imagem da Ordem.

É uma "pintura" de nossa Fraternidade que precisa ser apagada e redesenhada com as verdadeiras e nobres matizes, dignas da Arte Real que praticamos.

No entanto, antes de nos empenharmos em aprimorar nossa imagem na sociedade profana, há que se pacificar alguns posicionamentos observados no seio de nossas Oficinas. 

Não é raro observarmos um equivoco ou mesmo um conflito entre a necessidade de se fazer cumprir a lei e a falsa ideia de que isto pode se chocar com o sentimento de fraternidade.

Convido os queridos Irmãos a fazerem um exame de consciência e se questionarem por quantas vezes, desde que foram iniciados, voltaram a folhear as páginas de nossa Carta Magna e dos Regulamentos que regem o comportamento em Loja (e fora dela)?

Quantos, ou por desinformação ou mesmo por simples conforto pessoal, imaginam equivocadamente que o “oráculo” das normas é apenas o Irmão Orador? Certamente que este é o Oficial responsável por orientar seus Irmãos, mas não deve ser o único a debruçar-se sobre os textos legais.

Conhecimento implica liberdade, meus Irmãos!

“Conheceis a Verdade e ela vos libertará”, já dizia o Iluminado Mestre de Nazaré. E o estudo e meditação sobre a necessidade do cumprimento de nossas regras passa, necessariamente, por alguns princípios basilares do convívio em qualquer agrupamento humano.

Estarão sendo, nossos Aprendizes, suficientemente informados sobre a importância de se conhecer o Direito Maçônico? Estarão nossos Mestres cônscios de que a Fraternidade legítima não é, em absoluto, obstáculo para a aplicação da lei? São questões que, no nosso modesto entendimento, devem ocupar a mente de um Maçom minimamente comprometido com o teor do seu juramento iniciático.

Legislar não é tarefa trivial, meus Irmãos! Mas um agrupamento social não se perpetua sem regras. E ter ciência destas regras é condição sine qua non para cumpri-las.

Segundo nosso Irmão Albert Pike...

“A FORÇA das pessoas, ou a vontade popular, em ação e manifesta, simbolizada pelo MALHETE, regulada e guiada por e agindo dentro dos limites da LEI e da ORDEM, simbolizada pela RÉGUA DE VINTE E QUATRO POLEGADAS, tem como seu fruto LIBERDADE, IGUALDADE e FRATERNIDADE: liberdade regulada pela lei; igualdade de direitos à vista da lei; irmandade, com seus deveres e obrigações assim como com os seus benefícios.” [1]

Já Platão, em sua cidade-estado idealizada da clássica obra “A República” cita as quatro virtudes cardinais, quais sejam: a Força, a Coragem, a Temperança e a Justiça, preconizando também o princípio da Unidade das Virtudes, ou seja, que estas virtudes são indissociáveis, não podendo o homem ser portador apenas de uma delas. 

Fazendo um paralelo com a filosofia de nossa Ordem, de nada adiantaria a Força sem um cinzel habilidoso e um sábio direcionamento. Tampouco a beleza sedimentada em fracas bases ou mesmo a sabedoria sem um veículo enérgico e ao mesmo tempo harmônico de manifestação.

Em suma, a aplicação da Justiça a terceiros implica a Força e a Coragem de enfrentá-la também numa eventual situação de réu e, com o auxílio da Temperança, estar pronto a enfrentar as conseqüências dos próprios atos.

Igualmente o cumprimento da legislação, firmado em juramento, em nada afeta a verdadeira fraternidade, pois, via de regra, duas possibilidades bastante distintas se afiguram:

Uma, no caso do Maçom que se mantêm entre as duas paralelas que tangenciam o ponto dentro do círculo, poderoso símbolo retratado em nossos painéis, ou seja, que se esmera na trilha do caminho reto e que, por esta postura, dificilmente será alcançado por penalidades administrativas ou mesmo pelo braço forte da Justiça Maçônica.

Outra, no caso do Irmão que, por quaisquer razões ou contingências, transgride alguma das regras de conduta Maçônica (ou até mesmo profana). Não sendo ele usuário do simbólico “Anel de Giges”, este expressivo mito platônico, buscará a reparação para o seu deslize sejam quais forem as conseqüências.

Certamente estamos todos passíveis de errar e a grandeza de caráter reside justamente no enfrentamento das conseqüências do erro e no aprendizado dele decorrente. Ademais nenhum rancor ou mágoa deve ser direcionado a um Irmão investido do papel de fazer cumprir a legislação conquanto, nesta condição, simplesmente faz valer seu compromisso para com a Ordem e, quando me refiro ao termo “Ordem” é na sua concepção o mais universalista e menos provinciana possível.

Com o decorrer do tempo é absolutamente natural que a interação entre os Irmãos de uma mesma Oficina fortaleça os laços da Irmandade e o real sentido de nos reconhecermos como Irmãos salta aos olhos. Mas uma questão precisa ser destacada:

Que verdadeiro Maçom deixaria seu Irmão em uma situação difícil ou constrangedora? Antes não seria mais louvável aliviar o seu coração e estimulá-lo a cumprir seu dever mesmo em detrimento de si próprio? Estamos prontos para assumir realmente as conseqüências de nossas ações e omissões? Estamos realmente preparados, fortes, encorajados e com a necessária temperança para subjugar nossa tendência à autodefesa irrestrita e glorificar a aplicação da justiça mesmo que sua espada esteja sobre nossas cabeças? 

Ou continuaremos (perdoem-me a generalização) com a tendência de lançar mão da malfadada frase, símbolo não da tolerância, mas da permissividade:

“Aos amigos tudo e aos inimigos a lei” ?

Agradeço imensamente a atenção dos Irmãos e a oportunidade de partilhar estas reflexões.

Que o G:.A:.D:.U:. a todos ilumine e guarde em nossa caminhada.



BIBLIOGRAFIA CONSULTADA

[1] - PIKE, ALBERT – MORAL E DOGMA DO RITO ESCOCÊS ANTIGO E ACEITO DA MAÇONARIA – GRAUS SIMBÓLICOS, Livraria Maçônica Paulo Fuchs – São Paulo – SP.

[2] – FELLINI, JULIANO – O ANEL DE GIGES: VIRTUDE E VISIBILIDADE. http://www.espacoacademico.com.br/096/96fellini.htm

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Mario Vasconcelos

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